REVISTA EDUCAÇÃO - EDIÇÃO 167
O coordenador pedagógico se consolida cada vez mais como formador, orientador de um trabalho coletivo e elo entre as pessoas, o projeto escolar e os conteúdos programáticos |
Reger a escola do século 21 não é uma tarefa para qualquer maestro. Numa época em que se rediscutem espaço, tempo, modo, sujeito e conteúdo da aprendizagem, a figura do coordenador pedagógico se destaca como articuladora e representante dessa nova forma de pensar a educação. O coordenador é hoje - ou poderia ser - o elo a unir projeto pedagógico da escola, conteúdo programático e as pessoas envolvidas no projeto - professores, gestores, pais e alunos. E, para ele, é impossível harmonizar esses três polos sem responder a grandes questões da educação atual: de quem é a responsabilidade pelo aprendizado dos alunos? Como trabalhar o conteúdo de um currículo fixo de maneira diferente em cada turma? Como quebrar a barreira das disciplinas? Como apoiar o professor e contribuir com a sua formação?
Em meio a essas demandas, o cenário educacional contemporâneo introduz ingredientes que criam paradoxos para o exercício da função. Ao mesmo tempo que a cobrança social pela aprendizagem dos alunos, cada vez mais, recai de forma individualizada sobre o professor, ele é instado a trabalhar de forma interdisciplinar, em projetos conjuntos com as outras disciplinas e áreas de saber. No que tange ao currículo, há uma crescente defesa da constituição de um "mínimo múltiplo comum", sobretudo para algumas disciplinas do ensino médio, nas quais o aluno, caso mude de escola, está arriscado a estudar a mesma coisa nos três anos dessa etapa. Em paralelo, há uma grita pela manutenção das singularidades regionais - nem sempre justificada, pois muito do conhecimento com que a escola trabalha é universal.
Em meio a pressões de todos os lados - dos docentes, gestores, alunos e familiares - quais seriam, então, as características que fariam do coordenador um profissional capacitado a desempenhar o papel de articulador?
Um bom comunicador
Para dar conta de tamanho desafio, o coordenador precisa ter a seu favor algumas características. "Não podemos definir um perfil exato para o coordenador, pois é possível praticar a coordenação pedagógica com estilos variados. No entanto, o cuidado com as relações interpessoais tem de ser um norte a ser perseguido. As características que definem um bom coordenador talvez sejam as mesmas que caracterizam um bom professor", aponta Renata Cunha, docente do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Metodista de Piracicaba (Unimep).
Independentemente de suas semelhanças com os professores, o coordenador deve ser alguém, segundo Nilda Alves, da Faculdade de Educação da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), que saiba liderar sem perder de vista que está coordenando uma equipe em uma escola, e não em uma empresa, que tem dinâmica e foco diferentes. "E isso não significa ficar levando textos que conclamam o professor a trabalhar melhor, já que o professor está ali para cumprir o seu trabalho."
Fernanda Liberali, pesquisadora da PUC-SP com mestrado e doutorado dedicados ao papel do coordenador pedagógico, complementa que, como líder, ele deve conquistar o respeito do colegiado. "Para isso, precisa estar informado, estudar sempre. Não precisa saber todo o conteúdo de todas as áreas, mas tem de ter conhecimento teórico sobre a prática pedagógica." Outra característica importante do perfil é saber o momento de ouvir e de falar. "É preciso ouvir o professor para ganhá-lo, fazê-lo revelar o quê e como pensa, como acha que determinada questão tem de ser tratada."
Estabelecido esse canal de comunicação, fica mais fácil sugerir caminhos e propor reflexões acerca de convergências e divergências entre o que o professor tem em mente e o projeto pedagógico da escola. Essa relação de confiança é fundamental porque faz com que os professores se sintam à vontade para levar suas dificuldades e problemas para o coordenador, resume Fernanda.
Como a interação com os professores está na base do trabalho do coordenador pedagógico, pesquisadores do tema usam a teoria das relações interpessoais, do pedagogo norte-americano Donald Schön, para tentar compreender as habilidades de comunicação que esse profissional precisa desenvolver. De acordo com Schön, autor de Educando o profissional reflexivo (Artmed, 2000, edição esgotada), a relação entre instrutor e aprendiz (interpretados por especialistas como coordenador e professor) pode ser um sucesso ou um fracasso dependendo de como a hierarquia, o poder e o controle transparecerem na comunicação. Ele descreve duas situações. Na primeira, o coordenador deixa claro o seu poder como superior na hierarquia em relação ao professor. O resultado é descrito por Tânia Romero em seu doutorado A interação coordenador e professor: um processo colaborativo?: "As pessoas não querem experimentar, correr riscos, revelar suas conjecturas ou hipóteses, preocupadas que estão em munir-se de certezas para rebater pontos de vista adversos. O resultado é que as condições para aprendizagem não são estabelecidas."
O segundo modelo, focado no aprendizado mútuo, volta-se ao "entendimento, colaboração e questionamento das visões e interesses dos participantes envolvidos: um jogo de cartas na mesa, sem mistérios ou intenções ocultas". "Encoraja-se que sejam criadas condições para livre troca de informações, mesmo aquelas mais sensíveis e difíceis, que haja conscientização dos valores em jogo, bem como conscientização das limitações da própria capacidade, que haja comprometimento interno dos participantes quanto às decisões tomadas, comprometimento este baseado em satisfação intrínseca em vez de recompensa ou punição externa. O clima de confiança mútua que se estabelece (...) propicia um relacionamento colaborativo favorável a oportunidades de reflexão", escreve Tânia.
Espaço coletivo
O segundo modelo representa o canal aberto de comunicação para um trabalho coletivo, não hierarquizado. Para que essa proposta possa ser colocada em prática, Schön diz que o professor deve defender suas posições sem deixar de questionar e ouvir a crença dos colegas, justificar como chegou a seu ponto de vista, debatê-lo e, caso se sinta em meio a um problema ou dilema, expressar isso publicamente.
Todo o trabalho do coordenador, portanto, só é possível a partir de um espaço coletivo de debate com os professores. Só a partir dessa interação a figura do coordenador pode exercer a sua principal função, a de formador que promove a reflexão contínua junto aos professores sobre a prática pedagógica. Por isso é importante para os coordenadores compreender que a construção de conhecimento junto aos professores não acontece porque o coordenador ensina o professor como ensinar, e sim porque existe o intercâmbio entre eles. Essa ideia, advinda das teorias do psicólogo russo Lev Vigotski, tomada como base para entender as relações de aprendizagem dentro da escola, é hoje utilizada no estudo do papel do coordenador.
O dia a dia do coordenador
E na prática, o que faz essa figura dentro da escola? Renata Cunha, da Unimep, defende em seu artigo O coordenador pedagógico e suas crençasque um dos desafios é o de articular teoria e prática: "O saber e o fazer reflexivo precisam estar contextualizados, uma vez que a transformação da realidade educacional decorre do confronto entre teoria e prática. Nesse sentido, questiona-se quem seria o profissional responsável por mediar o coletivo docente e articular os momentos de formação. O coordenador pedagógico passa a ser considerado o interlocutor da formação docente na medida em que proporciona a reflexão sobre a prática e a superação das contradições entre o pensar e o agir", avalia.
Renata descreve o coordenador como mediador na escola, aquele que deve promover o diálogo entre gestão, professores, pais e alunos. E enumera algumas de suas atribuições: promover oportunidade de trabalho coletivo para construção permanente da prática docente e revisão do projeto político-pedagógico; acompanhar e avaliar o ensino e o processo de aprendizagem, bem como os resultados do desempenho dos alunos junto aos professores; assumir o trabalho de formação continuada e garantir situações de estudo e de reflexão sobre a prática pedagógica e aprofundamento das teorias da educação; auxiliar o professor na organização de sua rotina de trabalho; colaborar com o professor na organização de seleção de materiais adequados às diferentes situações de ensino e de aprendizagem; apoiar os estudantes e orientar as famílias, entre outras.
Na escola Projeto Vida, na zona norte paulistana, uma das coordenadoras do ensino fundamental 1, Sônia Favaretto, explica como essas funções se traduzem no cotidiano. Ela auxilia, por exemplo, os professores na elaboração de um plano de aulas, incluindo a busca de referências bibliográficas e instrumentos de avaliação. "Além disso, é preciso acompanhar esse plano - pautas de observação em sala devem ser combinadas previamente com os professores, assim como é possível a análise de vídeos com intenção formativa", explica. Uma das práticas de formação da escola é estudar coletivamente um registro de aula feito pelo professor. O coordenador (e em alguns momentos os próprios colegas) lê, formula perguntas, assinala aspectos relevantes e aponta o que falta para que a prática converse com a teoria, buscando fundamentar as atividades propostas. Outra técnica utilizada é a de oferecer um modelo de referência para o professor, pedindo que observe outros colegas dando aula.
Fernanda Liberali, que realiza trabalho de formação de coordenadores em escolas das redes pública e particular de São Paulo, sugere também que a equipe promova simulações de aula - para, por exemplo, aprender a trabalhar com um material novo - , ou que realize fóruns de discussão on-line para debater questões do cotidiano. "Dou muitos cursos sobre como sentar com o professor e discutir uma aula que não tem nada que ver com a proposta da escola, como conversar sobre isso, como ensinar o docente a ver se o realizado bate com o planejado, como o resultado do aluno reflete o planejamento, e como formar com foco em teorias de aprendizagem e linguagem. Às vezes o coordenador sabe disso na prática, mas não sabe explicar e trabalhar isso junto ao professor", afirma.
Sem receita
Existem experiências positivas e negativas, mas não há uma receita para o trabalho da coordenação pedagógica que garanta o sucesso do trabalho. Não é recomendável padronizar métodos e técnicas didáticas para serem usados entre coordenadores e professores, assim como é difícil crer que alunos aprendem e atribuem significado aos conteúdos da mesma forma.
Os repertórios cultural, teórico e de vivências dos docentes devem sempre ser levados em consideração. "Cada professor tem uma trajetória de formação, determinadas preferências, limitações, estilo de comunicação, postura em relação às diversas situações do cotidiano da escola. O coordenador precisa ser sensível às características de cada professor e ajudá-lo a refletir", explica Renata.
A função do coordenador pedagógico tem se consolidado, mas os próprios coordenadores muitas vezes não sabem qual é sua função. É o que diz a pesquisa O papel do coordenador pedagógico (2010), da Fundação Victor Civita, que revela que apenas 9% dos coordenadores entrevistados acreditam que faz parte do seu trabalho realizar um planejamento pedagógico e buscar melhorias para o ensino, aprendizagem e dificuldades dos alunos. Além disso, apenas 60% promovem reuniões com docentes.
Para Neurilene Ribeiro, coordenadora pedagógica regional do Instituto Chapada de Educação e Pesquisa, ONG que atua em 30 municípios baianos, a diferença entre um coordenador que sabe quais devem ser suas atividades e outro que não sabe com clareza é o comprometimento da escola com o projeto político-pedagógico. Uma escola que tem como objetivo sustentar uma prática pedagógica inovadora deve voltar a coordenação para sua real função, que é a da formação continuada.
"O coordenador deve passar menos tempo produzindo papéis e mais se dedicando ao triângulo professor, aluno e aprendizagem. Se o projeto político pedagógico é mais frágil, o cotidiano do coordenador é menos planejado e se dissolve em resolver problemas do dia a dia", alerta. Dessa forma, a atuação do coordenador tende a ser pontual e descontínua, com pouca sustentação educacional.
Ou seja, ao que parece, existem duas vertentes possíveis para que o trabalho do coordenador se estabeleça: uma é a do "faz-tudo" ou "apaga fogo", caracterizada pelo improviso e pela carência de reflexão educacional; a outra é voltada à formação docente e à construção de um projeto político-pedagógico com planejamento estratégico.
A formação do professor na escola
A formação continuada de professores deve acontecer em vários níveis, não apenas na escola, como defende Renata. Como acontece com profissionais de outras áreas, também os docentes se beneficiam com o alargamento de seu repertório cultural. É importante, também, que o professor se mantenha atualizado e informado inclusive para que os encontros de formação dentro da escola sejam mais produtivos, com mais possibilidade de troca de experiências e conhecimento. "A formação continuada que acontece na escola deve centrar-se naquela realidade e nas necessidades do grupo de professores. É uma formação compartilhada, centrada nas experiências e dilemas enfrentados pelos professores empenhados na superação das dificuldades identificadas", observa Renata, diferenciando a formação continuada na escola daquela feita individualmente.
Sônia Penin, do Departamento de Metodologia de Ensino e Educação Comparada da Faculdade de Educação da USP, observa que a formação dentro da escola é essencial, porque é o único espaço de contextualização do trabalho dos professores. Fora da escola, os problemas são mais genéricos e não fazem parte daquele universo específico. "O coordenador vai focar a formação em uma situação única: naquela escola, naqueles alunos, naqueles índices, naquele cotidiano vivido pela equipe e que deve ser problematizado", pontua. A existência de processos de formação continuada individual é fundamental para que a formação seja potencializada, complementando o processo.
Em meio a essas demandas, o cenário educacional contemporâneo introduz ingredientes que criam paradoxos para o exercício da função. Ao mesmo tempo que a cobrança social pela aprendizagem dos alunos, cada vez mais, recai de forma individualizada sobre o professor, ele é instado a trabalhar de forma interdisciplinar, em projetos conjuntos com as outras disciplinas e áreas de saber. No que tange ao currículo, há uma crescente defesa da constituição de um "mínimo múltiplo comum", sobretudo para algumas disciplinas do ensino médio, nas quais o aluno, caso mude de escola, está arriscado a estudar a mesma coisa nos três anos dessa etapa. Em paralelo, há uma grita pela manutenção das singularidades regionais - nem sempre justificada, pois muito do conhecimento com que a escola trabalha é universal.
Em meio a pressões de todos os lados - dos docentes, gestores, alunos e familiares - quais seriam, então, as características que fariam do coordenador um profissional capacitado a desempenhar o papel de articulador?
Um bom comunicador
Para dar conta de tamanho desafio, o coordenador precisa ter a seu favor algumas características. "Não podemos definir um perfil exato para o coordenador, pois é possível praticar a coordenação pedagógica com estilos variados. No entanto, o cuidado com as relações interpessoais tem de ser um norte a ser perseguido. As características que definem um bom coordenador talvez sejam as mesmas que caracterizam um bom professor", aponta Renata Cunha, docente do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Metodista de Piracicaba (Unimep).
Independentemente de suas semelhanças com os professores, o coordenador deve ser alguém, segundo Nilda Alves, da Faculdade de Educação da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), que saiba liderar sem perder de vista que está coordenando uma equipe em uma escola, e não em uma empresa, que tem dinâmica e foco diferentes. "E isso não significa ficar levando textos que conclamam o professor a trabalhar melhor, já que o professor está ali para cumprir o seu trabalho."
Fernanda Liberali, pesquisadora da PUC-SP com mestrado e doutorado dedicados ao papel do coordenador pedagógico, complementa que, como líder, ele deve conquistar o respeito do colegiado. "Para isso, precisa estar informado, estudar sempre. Não precisa saber todo o conteúdo de todas as áreas, mas tem de ter conhecimento teórico sobre a prática pedagógica." Outra característica importante do perfil é saber o momento de ouvir e de falar. "É preciso ouvir o professor para ganhá-lo, fazê-lo revelar o quê e como pensa, como acha que determinada questão tem de ser tratada."
Estabelecido esse canal de comunicação, fica mais fácil sugerir caminhos e propor reflexões acerca de convergências e divergências entre o que o professor tem em mente e o projeto pedagógico da escola. Essa relação de confiança é fundamental porque faz com que os professores se sintam à vontade para levar suas dificuldades e problemas para o coordenador, resume Fernanda.
Como a interação com os professores está na base do trabalho do coordenador pedagógico, pesquisadores do tema usam a teoria das relações interpessoais, do pedagogo norte-americano Donald Schön, para tentar compreender as habilidades de comunicação que esse profissional precisa desenvolver. De acordo com Schön, autor de Educando o profissional reflexivo (Artmed, 2000, edição esgotada), a relação entre instrutor e aprendiz (interpretados por especialistas como coordenador e professor) pode ser um sucesso ou um fracasso dependendo de como a hierarquia, o poder e o controle transparecerem na comunicação. Ele descreve duas situações. Na primeira, o coordenador deixa claro o seu poder como superior na hierarquia em relação ao professor. O resultado é descrito por Tânia Romero em seu doutorado A interação coordenador e professor: um processo colaborativo?: "As pessoas não querem experimentar, correr riscos, revelar suas conjecturas ou hipóteses, preocupadas que estão em munir-se de certezas para rebater pontos de vista adversos. O resultado é que as condições para aprendizagem não são estabelecidas."
O segundo modelo, focado no aprendizado mútuo, volta-se ao "entendimento, colaboração e questionamento das visões e interesses dos participantes envolvidos: um jogo de cartas na mesa, sem mistérios ou intenções ocultas". "Encoraja-se que sejam criadas condições para livre troca de informações, mesmo aquelas mais sensíveis e difíceis, que haja conscientização dos valores em jogo, bem como conscientização das limitações da própria capacidade, que haja comprometimento interno dos participantes quanto às decisões tomadas, comprometimento este baseado em satisfação intrínseca em vez de recompensa ou punição externa. O clima de confiança mútua que se estabelece (...) propicia um relacionamento colaborativo favorável a oportunidades de reflexão", escreve Tânia.
Espaço coletivo
O segundo modelo representa o canal aberto de comunicação para um trabalho coletivo, não hierarquizado. Para que essa proposta possa ser colocada em prática, Schön diz que o professor deve defender suas posições sem deixar de questionar e ouvir a crença dos colegas, justificar como chegou a seu ponto de vista, debatê-lo e, caso se sinta em meio a um problema ou dilema, expressar isso publicamente.
Todo o trabalho do coordenador, portanto, só é possível a partir de um espaço coletivo de debate com os professores. Só a partir dessa interação a figura do coordenador pode exercer a sua principal função, a de formador que promove a reflexão contínua junto aos professores sobre a prática pedagógica. Por isso é importante para os coordenadores compreender que a construção de conhecimento junto aos professores não acontece porque o coordenador ensina o professor como ensinar, e sim porque existe o intercâmbio entre eles. Essa ideia, advinda das teorias do psicólogo russo Lev Vigotski, tomada como base para entender as relações de aprendizagem dentro da escola, é hoje utilizada no estudo do papel do coordenador.
O dia a dia do coordenador
E na prática, o que faz essa figura dentro da escola? Renata Cunha, da Unimep, defende em seu artigo O coordenador pedagógico e suas crençasque um dos desafios é o de articular teoria e prática: "O saber e o fazer reflexivo precisam estar contextualizados, uma vez que a transformação da realidade educacional decorre do confronto entre teoria e prática. Nesse sentido, questiona-se quem seria o profissional responsável por mediar o coletivo docente e articular os momentos de formação. O coordenador pedagógico passa a ser considerado o interlocutor da formação docente na medida em que proporciona a reflexão sobre a prática e a superação das contradições entre o pensar e o agir", avalia.
Renata descreve o coordenador como mediador na escola, aquele que deve promover o diálogo entre gestão, professores, pais e alunos. E enumera algumas de suas atribuições: promover oportunidade de trabalho coletivo para construção permanente da prática docente e revisão do projeto político-pedagógico; acompanhar e avaliar o ensino e o processo de aprendizagem, bem como os resultados do desempenho dos alunos junto aos professores; assumir o trabalho de formação continuada e garantir situações de estudo e de reflexão sobre a prática pedagógica e aprofundamento das teorias da educação; auxiliar o professor na organização de sua rotina de trabalho; colaborar com o professor na organização de seleção de materiais adequados às diferentes situações de ensino e de aprendizagem; apoiar os estudantes e orientar as famílias, entre outras.
Na escola Projeto Vida, na zona norte paulistana, uma das coordenadoras do ensino fundamental 1, Sônia Favaretto, explica como essas funções se traduzem no cotidiano. Ela auxilia, por exemplo, os professores na elaboração de um plano de aulas, incluindo a busca de referências bibliográficas e instrumentos de avaliação. "Além disso, é preciso acompanhar esse plano - pautas de observação em sala devem ser combinadas previamente com os professores, assim como é possível a análise de vídeos com intenção formativa", explica. Uma das práticas de formação da escola é estudar coletivamente um registro de aula feito pelo professor. O coordenador (e em alguns momentos os próprios colegas) lê, formula perguntas, assinala aspectos relevantes e aponta o que falta para que a prática converse com a teoria, buscando fundamentar as atividades propostas. Outra técnica utilizada é a de oferecer um modelo de referência para o professor, pedindo que observe outros colegas dando aula.
Fernanda Liberali, que realiza trabalho de formação de coordenadores em escolas das redes pública e particular de São Paulo, sugere também que a equipe promova simulações de aula - para, por exemplo, aprender a trabalhar com um material novo - , ou que realize fóruns de discussão on-line para debater questões do cotidiano. "Dou muitos cursos sobre como sentar com o professor e discutir uma aula que não tem nada que ver com a proposta da escola, como conversar sobre isso, como ensinar o docente a ver se o realizado bate com o planejado, como o resultado do aluno reflete o planejamento, e como formar com foco em teorias de aprendizagem e linguagem. Às vezes o coordenador sabe disso na prática, mas não sabe explicar e trabalhar isso junto ao professor", afirma.
Sem receita
Existem experiências positivas e negativas, mas não há uma receita para o trabalho da coordenação pedagógica que garanta o sucesso do trabalho. Não é recomendável padronizar métodos e técnicas didáticas para serem usados entre coordenadores e professores, assim como é difícil crer que alunos aprendem e atribuem significado aos conteúdos da mesma forma.
Os repertórios cultural, teórico e de vivências dos docentes devem sempre ser levados em consideração. "Cada professor tem uma trajetória de formação, determinadas preferências, limitações, estilo de comunicação, postura em relação às diversas situações do cotidiano da escola. O coordenador precisa ser sensível às características de cada professor e ajudá-lo a refletir", explica Renata.
A função do coordenador pedagógico tem se consolidado, mas os próprios coordenadores muitas vezes não sabem qual é sua função. É o que diz a pesquisa O papel do coordenador pedagógico (2010), da Fundação Victor Civita, que revela que apenas 9% dos coordenadores entrevistados acreditam que faz parte do seu trabalho realizar um planejamento pedagógico e buscar melhorias para o ensino, aprendizagem e dificuldades dos alunos. Além disso, apenas 60% promovem reuniões com docentes.
Para Neurilene Ribeiro, coordenadora pedagógica regional do Instituto Chapada de Educação e Pesquisa, ONG que atua em 30 municípios baianos, a diferença entre um coordenador que sabe quais devem ser suas atividades e outro que não sabe com clareza é o comprometimento da escola com o projeto político-pedagógico. Uma escola que tem como objetivo sustentar uma prática pedagógica inovadora deve voltar a coordenação para sua real função, que é a da formação continuada.
"O coordenador deve passar menos tempo produzindo papéis e mais se dedicando ao triângulo professor, aluno e aprendizagem. Se o projeto político pedagógico é mais frágil, o cotidiano do coordenador é menos planejado e se dissolve em resolver problemas do dia a dia", alerta. Dessa forma, a atuação do coordenador tende a ser pontual e descontínua, com pouca sustentação educacional.
Ou seja, ao que parece, existem duas vertentes possíveis para que o trabalho do coordenador se estabeleça: uma é a do "faz-tudo" ou "apaga fogo", caracterizada pelo improviso e pela carência de reflexão educacional; a outra é voltada à formação docente e à construção de um projeto político-pedagógico com planejamento estratégico.
A formação do professor na escola
A formação continuada de professores deve acontecer em vários níveis, não apenas na escola, como defende Renata. Como acontece com profissionais de outras áreas, também os docentes se beneficiam com o alargamento de seu repertório cultural. É importante, também, que o professor se mantenha atualizado e informado inclusive para que os encontros de formação dentro da escola sejam mais produtivos, com mais possibilidade de troca de experiências e conhecimento. "A formação continuada que acontece na escola deve centrar-se naquela realidade e nas necessidades do grupo de professores. É uma formação compartilhada, centrada nas experiências e dilemas enfrentados pelos professores empenhados na superação das dificuldades identificadas", observa Renata, diferenciando a formação continuada na escola daquela feita individualmente.
Sônia Penin, do Departamento de Metodologia de Ensino e Educação Comparada da Faculdade de Educação da USP, observa que a formação dentro da escola é essencial, porque é o único espaço de contextualização do trabalho dos professores. Fora da escola, os problemas são mais genéricos e não fazem parte daquele universo específico. "O coordenador vai focar a formação em uma situação única: naquela escola, naqueles alunos, naqueles índices, naquele cotidiano vivido pela equipe e que deve ser problematizado", pontua. A existência de processos de formação continuada individual é fundamental para que a formação seja potencializada, complementando o processo.
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